Hoje acordei e preparei um café da manhã bem farto, com cara de domingo meio nublado. Enquanto eu e Flavio, meu namorido, tomávamos café, o Brownie, nosso filhote, esperava ansiosamente que eu deixasse cair um pedacinho do meu pão no chão e às vezes, colocava a cabeça no meu colo com uma carinha de pedinte.
Um cachorro esperto, que conhece minimamente de probabilidade: sabe, por experiência, que a chance disso acontecer é muito maior comigo, o pai que tem um certo déficit de atenção e hiperatividade mental, do que com o Flavio. Em seguida, fui rolar tela no Instagram orientado por um pensamento automático: não quero pensar em nada hoje!
Eis, que me deparo com um vídeo da Ana Beatriz Barbosa, psiquiatra, palestrante, escritora e especialista em TDAH 😊, onde ela diz que a frase do filósofo e físico renascentista René Descartes: “Penso logo existo”, limita o ser humano. Ela explica que o cérebro é um órgão que precisa ser controlado como outro qualquer, para que possamos ir além dos nossos pensamentos. a partir da nossa consciência. Não podemos deixar de reconhecer a grande contribuição de Descartes para o mundo, mas temos que levar em conta que o contexto do século XVII é muito diferente do que vivemos hoje, no XXI.
Com isso, vieram à mente 3 elementos: pensamento, consciência e evolução. A partir daí, um turbilhão de reflexões aflorou, impulsionado pela minha hiperatividade mental. E veja, era apenas um domingo com cara de preguiça. Senti uma pontada de inspiração...
Parei e me sentei no escritório, movido por uma grande vontade de escrever. O Brownie veio devagarzinho atrás de mim, deitou-se debaixo da mesa e colocou a patinha no meu tornozelo, dando a maior força! Então, comecei.
Se penso logo existo nos limita, o que nos amplia? O que Descartes diria hoje?
Não sei exatamente o que ele diria, mas eu acredito que a consciência determina a nossa existência. Se ampliarmos consciência, podemos vivenciar uma existência cheia de contribuições e evolução. Por outro lado, se não ampliamos nossa consciência, vivenciamos uma existência limitada por fatores exógenos ou por uma visão restrita de mundo.
Estamos num momento de transição para um cenário completamente diferente do atual e que ainda não está visível para nós, impactados por uma grande quantidade de novas tecnologias e pela inteligência artificial generativa.
Alguns futuristas afirmam o que, no fundo, todos nós já sabemos: será uma transformação sem precedentes na história humana.
Gosto da reflexão da Lala Dehenzelin, uma das mais importantes futuristas brasileiras: “Por qual lente queremos enxergar essa transformação: Transição ou Crise?”
Prefiro encarar como transição, porque me faz sentir esperança e emergir a seguinte pergunta: Que futuro queremos criar a partir de agora? Acredito que se orientarmos nossas decisões e ações por nossos pensamentos tradicionais, dogmas e pelas experiências do passado, existe um grande risco de criarmos um mundo meio Blade Runner ou Duna.
A transformação será tão significativa, que cada um de nós precisa estar consciente de que tem um papel fundamental e intencional nesse processo. Lembrando que o maior propósito da existência humana é evoluir e que a evolução coletiva só pode acontecer indivíduo a indivíduo. Por isso, eu me identifico muito com o que o nosso Selo Eight traz: A evolução do indivíduo, evolui o coletivo.
Então, precisamos começar o movimento, como loucos iluminados. Pensar fora da caixa, subverter a ordem natural das coisas e fazer perguntas sem respostas que influenciem positivamente esse processo de transição. Obrigado Ana Beatriz por questionar uma verdade que parecia ser tão simples e absoluta, como a de Descartes.
Imaginem se começássemos a viver um novo renascimento e iluminismo na história humana. Foi através do renascimento do século XV e XVI que saímos da Idade das Trevas.
Vivemos naqueles séculos uma revolução da razão, da ampliação do pensar, da importância da ciência. O Iluminismo originou-se no Renascimento cultural, científico e artístico. A razão e a ciência eram as bases para a compreensão do mundo. Deus está na natureza e no homem, podendo ser descoberto pela razão.
Porém, o novo renascimento precisa ir além da Física Moderna de Descartes e incluir a física quântica de Fritjoj Capra, físico contemporâneo, autor do livro Conexões Ocultas que justamente aborda essa transição da ciência. É necessário integrar os aspectos energéticos/ espirituais, a neurociência e comportamento com os aspectos físico-químicos nos estudos científicos.
Além disso, com base no que tenho aprendido sobre o comportamento humano e os impactos da inteligência artificial nos próximos anos, sinto que é a ampliação do pensar conectado com o sentir, que nos levará a um novo salto de consciência.
É fundamental ampliar nossa visão de futuro, a partir de um propósito claro e evolutivo. A prática da empatia, escuta ativa, intuição, observação, coerência, discernimento ao invés de julgamento podem nos levar a construir, desde já, um futuro mais promissor.
Se no renascimento tradicional vivemos a era do pensar, no novo renascimento, precisamos viver a era do sentir, sem perdermos a nossa capacidade ampliada de pensamento.
Otto Scharmer, coautor do livro Teoria U e professor do MIT, nos traz a importância de iluminarmos nossos pontos cegos na tomada de decisão (trazer consciência) e de incluirmos a etapa do “sensing”(combinação das palavras presence e sensing, que traz o significado de ir para o campo e sentir) em processos de mudança ou inovação.
Ele destaca a importância de agirmos coletivamente, considerando a complexidade do mundo atual, o que reforça a necessidade do desenvolvimento das habilidades citadas.
A diversidade em todos os sentidos potencializa a coletividade, pois possibilita aprofundar o entendimento de questões importantes e a construção de soluções muito mais sistêmicas e aderentes à realidade em que vivemos.
Por isso, no âmbito das organizações e governos, a equidade e a inclusão devem ser, desde já, uma prioridade. O cuidado com a saúde mental deve ser outra prioridade em função do medo e da ansiedade provocada por tantas informações, mudanças e incertezas.
E a arte pode potencializar o desenvolvimento humano, pois nos permite experimentar perspectivas diferentes, através de uma experiência mais sensorial e ampliar a conexão com o sentir e a criatividade. Particularmente, acho que a arte é quântica, pois nos coloca em outra frequência energética.
Você pode estar se perguntando: E por onde começar?
Individualmente, acho que o primeiro passo é entender as transformações que estamos passando e seus impactos, estar ciente.
O segundo, é estabelecer pausas recorrentes para refletir sobre qual mentalidade você está adotando nas suas decisões e ações, o quanto seus medos e vieses têm limitado a sua percepção das coisas, têm influenciado seus comportamentos. Exercitar a presença para estar consciente.
Mesmo assim, ainda vamos ligar muitas vezes o piloto automático e seguir repetindo comportamentos antigos, o que reforça ainda mais a necessidade dos momentos de pausa e reflexão individual.
Coletivamente, precisamos usar a diversidade e a inteligência do grupo para refletir de forma sistêmica sobre os impactos do que fizemos até aqui, gerar mais conexão e alinhar propósito e visão antes de sairmos fazendo ou de buscarmos soluções, atualizando-os de acordo com as tendências. Segundo Otto Scharmer, precisamos aprender com o futuro à medida que ele emerge. Não é fácil, mas é possível!
Para terminar, não poderia deixar de citar o Brownie. Depois de bastante tempo debaixo da mesa, ele foi para o tapete, para ficar mais quentinho e seguiu me observando.
O déficit de atenção e a hiperatividade mental podem ser encarados por mim, algumas vezes, como limitadores. Acho que do ponto de vista dele, déficit de atenção é uma habilidade admirável, porque muitas vezes, atende as necessidades dele de comer comidinhas mais humanas!
Porém, depois de algumas horas escrevendo, ele pulou na minha perna, tirando a minha mão do teclado com a pata, só para me lembrar que preciso pausar: “Lembra? Hoje é um domingo com cara de preguiça!”. Praticamente um Brené Brownie que me faz refletir! Com todo respeito e reverência à excelente Brené Brown, pesquisadora, escritora e palestrante que tem como um de seus temas principais a vulnerabilidade humana.
Ainda bem que tenho o Brownie no meu coletivo familiar!
Renato Santos
Facilitador de Diálogos. Apaixonado por futurismo, humanismo e diversidade, equidade e inclusão
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